Blog do Ronaldo

sexta-feira, março 05, 2010

Anestesia, amizades, tempo, nossa vida

Nossa vida pode ser melhor ou pior a cada dia. Depende de nossas atitudes e escolhas. E elas são serem mais acertadas se soubermos aprender com nossos erros e acertos – e também com as lições que outros nos ensinam.


Nessa semana, me encantei com a coluna online publicada pela jornalista Eliane Brum. Dona de mais um prêmio Troféu Mulher Imprensa de melhor repórter de revista, ela está deixando a Época. Fez uma escolha: quer ter tempo para viver. Pretende desenvolver projetos pessoais, continuar escrevendo, mas sem abandonar mão da vida.

A jornalista relembra algumas de suas reportagens nascidas pela fixação em falar sobre a morte. A morte, como diz Eliane, nos faz refletir sobre como viver. Ela sustenta:

- Lidar bem com a certeza que todos temos de morrer um dia, mais cedo ou mais tarde, é fundamental para viver melhor. E para compreender a natureza fugaz e preciosa da vida.

Ao que parece, a jornalista está encontrando o seu jeito de melhor aproveitar o que esta existência oferece.

Atitudes como a dela – que sequer conheço, mas admiro à distância – me fazem pensar nessa rotina louca. Tenho dito aqui dezenas de vezes: temos abdicado da vida por nos dedicarmos ao que ainda não temos e não conquistamos. Talvez devêssemos optar por jeito mais simples de viver para termos a chance de tirar dela o que há de melhor.

Não é fácil abrir mão de certas coisas. Dinheiro, estabilidade, plano de saúde etc, para termos tempo e chance de escolher o que vamos fazer. Ter e manter os amigos, investir nos relacionamentos, por exemplo.

A amizade é uma das coisas mais preciosas que temos. Às vezes, escolhemos caminhos que nos fazem ter poucos amigos ou ter pouco tempo para eles. Em certas circunstâncias perdemos pessoas queridas simplesmente porque deixamos de alimentar o relacionamento. Creio que todos nós experimentamos isto em alguns momentos da vida. Em certas ocasiões me cobro por estar tanto tempo sem falar com gente que amo e que guardo no coração.

Felizmente, a vida parece nos dar novas oportunidades. Elas surgem nas atitudes de alguém ou mesmo num fato que nos inspira a mudar. Noutras situações, a vida nos presenteia e, sabe-se lá por qual razão, traz-nos de volta a chance de retomarmos o que havíamos perdido.

Esta semana me senti assim. Depois de cinco anos, reencontrei uma pessoa muito especial. Nosso contato nesses últimos tempos não foi sequer sombra do que vivemos em nossa amizade. Já havíamos passado por tudo o que bons amigos experimentam. Sorrimos juntos, choramos juntos, mas deixamos escapar essa amizade por nos envolvermos demais com nossos compromissos.

Entretanto, como disse, às vezes a vida nos presenteia com novas oportunidades. Quando por alguns segundos nos abraçamos, a impressão que tivemos era que o tempo não havia passado para nós. O mesmo carinho, respeito, admiração estavam lá bem guardados no coração, apenas esperando a oportunidade de serem revividos.

Depois de conversarmos por minutos que pareciam descolados do relógio, despedimo-nos com a certeza que amizades verdadeiras não morrem. Nas horas seguintes, recordei do texto publicado pela jornalista Eliane Brum. Voltei a pensar no quanto perdemos pelo simples fato de abrirmos mão do controle, do gerenciamento de nosso tempo.

Os dias passam, os meses e anos se vão, a vida se esvai e não nos damos conta que invertemos as prioridades. Anestesiados por esta nova forma de viver, deixamos de sentir os gostos, as texturas, os cheiros e de nos relacionarmos. Como escreveu o pesquisador J. Hillman, este é o tempo de voltarmos a ter sensações reais, concretas. “Devolver a alma ao mundo significa conhecer as coisas. Ter relações íntimas, conhecimento carnal”.