Blog do Ronaldo

domingo, junho 13, 2010

Palavras traduzem nossas emoções?

Palavras. Elas são poderosas. Permitem que alteremos o meio em que estamos, exteriorizando o que é do mundo interior. Expressam nossas vontades, desejos, angústias, anseios. Refletem nossa alma. São mais que instrumentos para nos comunicarmos. Afinal, pensamos por meio de palavras. Mas teriam a capacidade de traduzir todas as nossas sensações, nossos sentimentos?

Um pensador russo, M. Bakhtin, apontou que a palavra é o modo mais puro e sensível da relação social. Também disse que preenche qualquer espécie de função ideológica: estética, científica, moral, religiosa. Entretanto, ressaltou que nem todos os fenômenos podem ser inteiramente substituídos por palavras.

Amo as palavras. Não tenho o talento de um João Ubaldo Ribeiro, com todo seu cuidado e esmero na escolha de cada uma delas para compor seus textos. Estou longe, muito longe dele. Porém, sinto-me encantado com seu poder mágico de sugerir o que vai no coração. Quando bem escolhidas, comovem, tocam. Também são capazes de polemizar, convencer, calar. É por isso que Bakhtin ressalta: a palavra é um signo neutro. Em qualquer contexto, servimo-nos delas para nos expressarmos.

Bem, não quero aqui desfilar argumentos da lingüística, da semiologia. Não é esta a intenção. Meu texto é apenas a expressão de uma vontade de pensar a palavra como esse instrumento que nos faz compreendidos pelo outro. Mas que, mesmo combinadas e recombinadas, nem sempre traduzem o que sentimos.

Por exemplo, como tratar do amor que uma mãe tem por seu filho? Teriam o poder de revelar tamanho sentimento? Como alguém apaixonado expressa a emoção de estar ao lado da pessoa amada? Como falar da saudade que aperta, que machuca e faz chorar? Como expressar a sensação de um abraço, que acalma, conforta e nos faz perder a noção de tempo e lugar? Como, depois de seis meses repetindo todos os dias “eu te amo”, garantir que a frase expresse com a mesma força tamanho sentimento?

Nossas emoções são maiores que as palavras. Elas sugerem, mas não refletem. Falar das coisas do coração não é o mesmo que pedir: “tire o copo da mesa, por favor” ou “você poderia me dizer quanto está custando essa televisão?”. Não é simples assim. Por isso, quando tratamos de coisas abstratas o universo da linguagem pode conspirar contra ou a nosso favor.

As palavras, depois de ditas ou escritas, passam a ter vida própria. Já não nos pertencem. São do mundo, pertencem ao outro – ao leitor ou ao ouvinte. Por isso, ganham novos sentidos. Muitas vezes, diferentes demais daquilo que desejávamos. Não dá para controlar.

Esta é uma das riquezas desse signo. Elas são experimentadas de acordo com nossas vivências. Sentimos cada uma delas de uma forma. Isto é mágico. Por um lado, podemos concentrar todos os nossos desejos na composição das frases mais lindas e tocarmos alguém; por outro, nossa poesia pode simplesmente ser ignorada.

Porém, essa magia também guarda perigos. Mais que deixar de alcançar nossos objetivos, um enunciado é passível de ser compreendido de maneira distorcida. Não raras vezes, alguém se chateia com algo que falamos. Muitas vezes, a intenção era dizer uma coisa, mas o outro entendeu diferente. Brigas acontecem, mágoas ficam guardadas no peito. Pior é que, em algumas situações, somos incapazes de reconhecer que não somos donos do discurso. E que a fala ganha sentidos no outro. É o ouvinte, leitor que dá o significado.

A compreensão do encanto das palavras, sua incompletude na tradução de nossas emoções, a autonomia dos sentidos são aspectos fundamentais e transformadores, inclusive nas relações humanas. Tornar-nos-íamos mais compreensivos com o outro se pudéssemos perceber que a vida que se expressa em palavras não é a mesma que se passa no coração.

terça-feira, junho 08, 2010

Escravos da imagem

Para a convivência social, temos que ter certo cuidado com o que falamos, com a maneira como nos portamos; nossos gestos e ações falam sobre nós. Tempos atrás, fiz um programa exatamente sobre este assunto. Na ocasião, conversei com a psicóloga Isla Gonçalves, uma especialista no tema. Recordo que apresentamos várias dicas sobre como devemos nos portar para nos relacionarmos bem, sermos bem vistos por familiares, amigos e, obviamente, no mundo dos negócios.

Hoje, há cursos específicos que ensinam a ter postura. Não se trata simplesmente de etiqueta. A ideia é treinar as pessoas a fim de se tornarem seres relacionais, capazes de se adequarem aos diferentes ambientes. Se o problema está na incapacidade de convivência com a mulher, namorada etc, manda o sujeito para a terapia ou para um curso de noivos/casais. Não sabe trabalhar em equipe? Capacitação nele! Passa imagem de arrogante, prepotente ou egoísta? Treinamento resolve. Na verdade, com a orientação adequada, qualquer pessoa consegue melhorar bastante sua imagem e garantir o sucesso desejado – seja na vida pessoal, amorosa ou profissional.

Todos nós carecemos de máscaras. Elas escondem nossas fragilidades, silencia nossos impulsos irracionais. Não há quem as dispense completamente. São fundamentais. Precisamos para “engolir alguns sapos”, preservar amizades, não agredir aqueles que amamos, evitar mágoas… Sem maquiarmos nossa verdadeira face, a convivência social se tornaria impossível. Afinal, as pessoas que mais rejeitamos são justamente aquelas que se dizem as mais “verdadeiras”.

Quem costuma dizer “eu não levo desaforo pra casa”, geralmente se torna irritante e a evitamos. Ninguém gosta de ser agredido. Ninguém se sente bem ao lado de quem fala demais e não mede as palavras. O trato com o que vamos dizer e com a maneira com que falamos é um princípio fundamental para o estabelecimento e manutenção dos relacionamentos. Trata-se, portanto, de uma máscara que usamos. Se não nos preocupássemos com o outro ou com o que vão pensar de nós, agiríamos da mesma forma? Talvez não.

Queremos causar uma boa impressão. É natural. Afinal, buscamos no outro nossa afirmação e identidade. Muito daquilo que acreditamos que somos é referenciado pelo que falam de nós. Poucos podem dizer “não ligo para o que pensam de mim”. Talvez até relevamos a opinião que alguns têm a nosso respeito, mas, por outro lado, não dá para negar que vamos considerar a imagem que construímos – ainda que em apenas certos meios ou diante de algumas pessoas.

Nada disso é ruim. Faz parte de nossa vida. É necessário. Somos frutos do meio. Não estamos sozinhos no mundo. Entretanto, muitas vezes nos tornamos reféns de nossa imagem. Quando isso acontece, temos um problema. Perdemos a identidade. Deixamos de ser o que somos para viver como querem que vivamos. Pode até parecer interessante durante algum tempo, pois é desejável a aprovação do outro. Mas aos poucos a infelicidade bate à porta e o que era bonito se torna feio, o que era claro fica escuro, a vida fica amarga e os dias passam a ser uma grande mentira.

Não há uma receita para escapar do risco de se tornar escravo de sua própria imagem. Contudo, uma dica pode ajudar: conhecer-se. Quem se conhece, percebe o que dá prazer, o que causa satisfação e é capaz de avaliar até que ponto as máscaras são necessárias. Elas podem até nos ajudar a viver melhor, mas não podemos permitir que ocultem quem verdadeiramente somos, silenciando nossos sonhos, desejos, escondendo nosso caráter e personalidade.